Reflexão: O Emancipa é um movimento social "urbano"?
David Harvey é um dos maiores especialistas vivos na obra de Marx. Além de compreender e ensinar os fundamentos clássicos do Capital, ele tenta incansavelmente atualizar o marxismo para que este ainda possa servir de lentes para a compreensão do sistema econômico vigente e das dialéticas dele decorrentes neste século XXI.
Uma
das muitas boas sacadas de Harvey foi perceber que a fábrica não é mais
o principal destino dos excedentes da produção capitalista. Ou seja, o
sistema vem buscando novos espaços para transformar em mercados e
viabilizar a capitalização dos lucros. O autor sustenta, então, que, nos
últimos anos, a cidade tem sido esse espaço e o processo de urbanização
o grande financiador do crescimento econômico e, por consequência, da
concentração de renda e de riquezas. Daí porque perdemos (se é que um
dia o tivemos) o poder sobre o processo de expansão das nossas cidades,
dado que a ocupação dos espaços e a distribuição dos excedentes é
definida por aqueles que possuem o capital financeiro (pessoas que, na
maioria dos lugares, são também as que possuem o capital político).
Tomando o exemplo de Marabá, é em razão disso que o pobre mora longe,
que são distribuídas casas onde não há cidade, que bairros inteiros não
possuem asfalto, que a distribuição de água é feita a partir das áreas
centrais, que o transporte público é precário, etc.
Nesse
contexto, o autor aponta que o enfrentamento por parte das populações
marginalizadas deve ser feito sob uma perspectiva de luta urbana, pois
melhorando o lugar onde vivemos poderemos melhorar a nós mesmos e a
nossa vida como um todo. Mas para que esse enfrentamento ocorra e
alcance resultados efetivos, se faz necessária a organização das pessoas
em movimentos sociais urbanos e uma postura anticapitalista em sua
práxis.
No
que toca à mobilização das pessoas em torno de um objetivo coletivo e
comum, isso está cada vez mais difícil de conseguir nesses tempos
relações líquidas, pautadas na mixofobia (aversão a se misturar com
outras pessoas).
No
que toca à postura anticapitalista, segundo o autor, esta pressupõe
três requisitos: a) um enfrentamento do "obsceno acúmulo global de
riquezas", a partir de relações extra mercado entre as pessoas; b) novos
hábitos, no sentido de uma vida simples e ambientalmente adequada; c)
um novo modelo de mensuração do desenvolvimento e do progresso, para
além do crescimento econômico.
O
Emancipa, enquanto movimento social, defende e luta pela democratização
do acesso à educação, e isso significa mobilização, empoderamento e
emancipação para as classes marginalizadas. Nosso espaço típico de luta é
a cidade - muito embora isso não impeça eventuais ações também nas
zonas rurais. Nosso objeto de luta é a educação, um serviço urbano,
diretamente relacionado ao processo de ocupação das cidades. Mas, será
que somos, de fato, um "movimento social urbano", na perspectiva
anticapitalista proposta por Harvey? Precisamos ser?
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Sugestão
de leitura: Cidades Rebeldes, de David Harvey, publicado em 2014 pela
Martins Fontes. Solicite o empréstimo dessa obra pelo e-mail
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